Dois ou três poemas de Mr Charles Baudelaire para abrir o apetite,a quem tiver o prazer de os ler. Outro dos meus eleitos ;)
OBSESSÃO
Grandes bosques, de vós, como das catedrais,
Sinto pavor; uivais como órgãos; e em meu peito,
Câmara ardente onde retumbam velhos ais,
De vossos De profundis ouço o eco perfeito.
Te odeio, oceano! Teus espasmos e tumultos,
Em si minha alma os tem; e este sorriso amargo
Do homem vencido, imerso em lágrimas e insultos,
Também os ouço quando o mar gargalha ao largo.
Me agradarias tanto, ó noite, sem estrelas
Cuja linguagem é por todos tão falada!
O que procuro é a escuridão, o nu, o nada!
Mas eis que as trevas afinal são como telas,
Onde, jorrando de meus olhos aos milhares,
Vejo a e olharem mortas faces familiares.
in "As Flores do Mal" - Charles Baudelaire
A DESTRUIÇÃO
Sem cessar, ao meu lado, o Demónio arde em vão;
Nada em torno de mim como um ar vaporoso;
Eu degluto-o e sinto-o, a queimar-me o pulmão,
Enchendo-o de um desejo eterno e criminoso.
Toma, ao saber o meu amor à fantasia,
A forma da mulher, que eu mais espere e ame,
E tendo sempre um ar de pura hipocrisia,
Acostuma-me a boca a haurir um filtro infame.
Longe do olhar de Deus ele conduz-me assim,
Quebrado de fadiga e numa ânsia sem fim,
Às planícies do tédio, infinitas, desertas,
E atira aos olhos meus, cheios de confusão,
Ascorosos rasgões e feridas abertas,
E os aparelhos a sangrar da Destruição!
in "As Flores do Mal" - Charles Baudelaire
O FIM DA JORNADA
Debaixo de uma luz tão baça,
Vai, corre e dança sem razão,
A vida, gritante e devassa.
Porém, logo que, na amplidão,
A noite voluptuosa sonha
Tudo abrandando, mesmo a fome,
Tudo apagando, até a vergonha,
O poeta em lassidão sem nome
Diz: - “Os meus ossos e a minha alma
Invocam ardentes a calma;
E, de coração tumular,
Agora vou dormir de lado,
Rolar em vosso cortinado,
Ó trevas de refrigerar!”
in "As Litanias de Satã" - Charles Baudelaire
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